Guerra Fria
A Guerra Fria foi um conflito
político-ideológico que foi travado entre Estados Unidos (EUA) e União Soviética
(URSS), entre 1947 e 1991. Tal conflito foi responsável por polarizar o mundo
em dois grandes blocos, um alinhado ao capitalismo e outro alinhado ao
comunismo.
Ao longo da
segunda metade do século XX, a polarização mundial resultou em uma série de
conflitos de pequena e média escala em diferentes locais do mundo. Esses
conflitos contavam, muitas vezes, com o envolvimento indireto de EUA e URSS, a
partir do financiamento, da disponibilização de armas e do treinamento militar.
Contudo, nunca houve um confronto aberto entre americanos e soviéticos,
sobretudo pela possibilidade de destruição do planeta em larga escala caso
houvesse um conflito entre os dois. Apesar dos discursos afiados e da intensa
atuação estratégica para manter sua zona de influência, americanos e soviéticos
foram cautelosos ao extremo e evitaram um conflito contra o outro.
Causas:
A Guerra Fria
foi iniciada logo após a Segunda Guerra Mundial e, apesar das variadas
interpretações, existe um certo consenso entre os historiadores de que o marco
que iniciou a Guerra Fria seja o discurso realizado pelo presidente americano,
Harry Truman, em 1947, feito no Congresso americano, quando ele solicitava
verbas para que os Estados Unidos pudessem evitar o avanço do comunismo na
Europa. Na visão de Truman, era papel dos EUA liderar a luta contra o avanço do
comunismo no continente europeu.
Esse discurso
deu início ao que ficou conhecido como Doutrina
Truman, que consistiu no conjunto de medidas tomadas pelos EUA para conter
o avanço do comunismo. A primeira ação tomada por essa doutrina foi o Plano Marshall, plano de recuperação
econômica da Europa com o qual os americanos forneceriam grandes somas de
dinheiro para os países interessados.
A atuação dos Estados
Unidos na Europa por meio da Doutrina Truman justifica-se única e
exclusivamente pelo discurso alarmista que apresentava a URSS como uma potência
expansionista e que procuraria conquistar todo o continente europeu sob a égide
do comunismo. Os americanos sabiam que os problemas econômicos da Europa no
pós-guerra eram um campo fértil para o crescimento da ideologia comunista lá.
Ainda assim,
historiadores como Eric Hobsbawm e Isaac Deutscher argumentam que a União
Soviética não era uma nação expansionista e não demonstrava interesse em atuar
fora da sua zona de influência (o Leste Europeu). Esses historiadores apontam
que a União Soviética não tinha interesses em financiar e apoiar movimentos
comunistas armados em outras partes do mundo e que a postura soviética no
pós-guerra era abertamente defensiva por causa da destruição do país como
consequência da Segunda Guerra Mundial.
A ideia por trás
da ação americana em impor-se como nação hegemônica na Europa e no mundo é
explicada pelos interesses de Truman em manter elevados os índices de
crescimento econômico do país. Assim, o discurso maniqueísta praticado pelos
americanos começou a ser praticado também pelos soviéticos, e as relações dos
dois países em nível internacional passaram a ser baseadas no boicote.
Além disso,
existem evidências que apontam que o governo soviético não tinha interesse em
expandir-se territorialmente e tinha o objetivo de assegurar apenas a sua área
de influência. Isso de fato aconteceu e, na Segunda Guerra, os locais invadidos
pelo Exército Vermelho, que era o exército soviético, foram transformados em
Estados-satélites do regime comunista de Moscou.
Características:
- Polarização
do mundo: a disputa travada entre americanos e soviéticos resultou em uma
forte polarização do mundo que afetava as relações internacionais dessas nações
como um todo. Houve uma tentativa de criar um movimento não alinhado em que
algumas nações procuravam seguir um caminho independente sem necessariamente se
vincular com alguma das duas potências.
-
Corrida armamentista:
a procura pela hegemonia internacional fez com que as duas potências
investissem bastante no desenvolvimento de novas tecnologias bélicas. Assim, no
período, o número de armas nucleares e termonucleares produzidas disparou.
-
Corrida espacial:
a corrida espacial foi um dos campos de disputa entre americanos e soviéticos
e, ao longo da década de 1960, inúmeras expedições espaciais foram realizadas.
-
Interferência estrangeira: tanto americanos quanto soviéticos interferiram em
assuntos internos de diferentes países do planeta. Dois exemplos são a
interferência americana na política brasileira na década de 1960 e a
interferência militar no Afeganistão na década de 1980.
Acontecimentos
importantes da Guerra Fria
A Guerra Fria
criou um clima de forte tensão internacional a respeito da possibilidade de um
conflito aberto entre americanos e soviéticos. A existência de armamentos
nucleares e termonucleares sob a posse desses países tornava essa expectativa
de um conflito muito mais pavorosa, pois um conflito desse tipo causaria a
aniquilação da humanidade. Ao longo das décadas da Guerra Fria, houve inúmeros
momentos de tensão que serão destacados a seguir.
A Revolução
Chinesa
A Guerra Civil
Chinesa, que se arrastava desde a década de 1920, retornou com força depois da
Segunda Guerra Mundial, e o fortalecimento dos comunistas, liderados por Mao
Tsé-tung, levou os americanos a apoiar os nacionalistas, liderados por Chiang
Kai-shek.
A vitória dos
comunistas, conhecida como Revolução
Chinesa, em 1949, alarmou os americanos sob a possibilidade de que o
comunismo fosse disseminado pelo continente asiático por meio da influência
chinesa.
A Guerra
da Coreia
Primeiro momento
de grande tensão após a Segunda Guerra Mundial. Esse conflito iniciou-se em 1950,
quando os comunistas norte-coreanos, apoiados por chineses e soviéticos,
invadiram o território sul-coreano, apoiados pelos americanos. O objetivo era
reunificar a Península da Coreia sob a liderança dos comunistas.
Esse conflito
contou com o envolvimento direto de soldados americanos, mas ao longo do
conflito nenhum dos dois lados sobressaiu-se e o conflito teve fim, em 1953,
com um armistício que ratificou a divisão das Coreias – divisão que existe até
hoje. Os soviéticos também participaram desse conflito, mas os americanos não
tomaram nenhuma ação, pois queriam evitar um conflito direto.
A Crise
dos Mísseis em Cuba
A Crise dos
Mísseis foi o momento de maior tensão entre as duas potências da Guerra Fria e
se passou em 1962. Naquele ano, o serviço de inteligência dos EUA descobriu que
a URSS estava instalando uma base de mísseis em Cuba, país que havia passado
por uma revolução nacionalista em 1959, conhecida como Revolução Cubana, liderada por Fidel Castro. A inteligência
americana sabia que os mísseis soviéticos representavam pouca ameaça para os
EUA, mas o presidente americano sabia que a questão teria repercussão negativa
sob seu governo e decidiu intervir.
O governo
americano disse aos soviéticos que se os mísseis não fossem retirados, seria declarada
guerra. As negociações arrastaram-se durante semanas e os dois lados chegaram a
um acordo. Os soviéticos decidiram retirar os mísseis de Cuba e os americanos
aceitaram retirar seus mísseis instalados na Turquia.
A Guerra
do Vietnã
A Guerra do Vietnã
foi um conflito travado entre 1959 e 1975 entre Vietnã do Norte e Vietnã do Sul
e ambos lados procuravam unificar o país sob seu controle. Os americanos
entraram nesse conflito, em 1965, e enviaram milhares de soldados ao Vietnã.
Essa guerra foi extremamente impopular nos EUA, e os americanos retiraram-se do
conflito, sem alcançar seus objetivos, em 1973. Os comunistas tomaram o
controle do país, em 1976, logo após vencerem a guerra. A Guerra do Vietnã foi
a primeira guerra televisionada do mundo e só causou grande comoção no país,
com passeatas e revoltas, depois que jovens brancos de classe média passaram a
morrer nos combates contra os vietcongs (membros da FNL, Frente Nacional para a
Libertação do Vietnã).
A Guerra
do Afeganistão
O Afeganistão é
mencionado por muitos como o “Vietnã da União Soviética”. Esse conflito foi
travado entre 1979 e 1989 e se iniciou quando os soviéticos invadiram o
Afeganistão para apoiar o governo comunista daquele país contra rebeldes
islâmicos. A invasão soviética levou os americanos a financiarem e treinarem os
rebeldes islâmicos e esse conflito foi extremamente penoso para os soviéticos
que se retiraram em 1989.
Cooperação
política e militar
Ao longo dos
anos da Guerra Fria, americanos e soviéticos procuraram coordenar ações para
concentrar o seu poder sob sua zona de influência. Uma das estratégias
utilizadas foi a criação de formas de cooperação econômica e militar dos quais
destacam-se o Plano Marshall e a Comecon, no âmbito econômico, e a OTAN e o
Pacto de Varsóvia, no âmbito político-militar.
Plano
Marshall e Comecon
Em contrapartida
ao Plano Marshall (plano de recuperação econômica com capitais
norte-americanos), os soviéticos criaram o Conselho para Assistência Econômica
Mútua, mais conhecido como Comecon
(sigla em inglês), em que lideravam os países socialistas. O plano foi criado
pelos soviéticos para evitar que o Plano Marshall seduzisse as nações do bloco
comunista a aliarem-se com os americanos.
Otan
e Pacto de Varsóvia
No campo
militar, foi criada a Organização do
Tratado do Atlântico Norte (Otan), em 4 de abril de 1949. A ideia da OTAN
era criar uma aliança militar de países alinhados aos Estados Unidos visando a
impedir uma posição de agressão dos soviéticos. A OTAN foi uma forma de os EUA
imporem a sua hegemonia sobre o continente europeu.
Na mesma proposta, os soviéticos criaram
o Pacto de Varsóvia, em 1955. A
ideia era garantir a segurança das nações do bloco comunista e evitar uma
possível agressão realizada pelos estadunidenses. Assim, se uma nação fosse
agredida, todas as outras se mobilizariam em defesa dela.
Alemanha
na Guerra Fria
No caso da
Alemanha, a Guerra Fria teve impactos muito maiores do que em grande parte do
mundo. Isso porque ao final da Segunda Guerra a Alemanha foi dividida em zonas
de influência de soviéticos, americanos, franceses e britânicos. Essa divisão
teve reflexos no futuro do país que acabou sendo dividido em duas nações:
- República
Democrática Alemã (RDA), alinhada à União Soviética e conhecida como
Alemanha Oriental;
- República
Federal da Alemanha (RFA), alinhada aos Estados Unidos e conhecida como
Alemanha Ocidental.
A cidade de
Berlim também foi dividida e transformou-se na capital das duas Alemanhas. O
lado oriental era comunista e o lado ocidental era o capitalista. Ao longo da
década de 1950, milhares de cidadãos da Alemanha Oriental começaram a mudar-se
para Berlim Ocidental, seduzidos pelas comodidades do consumo e pelas promessas
de liberdade, já que o governo do lado Oriental caracterizou-se por uma ditadura.
Para impedir essa fuga de cidadãos, as autoridades da União Soviética e da
Alemanha Oriental decidiram construir um muro isolando Berlim Ocidental.
Durante 28 anos,
o Muro de Berlim separou os dois
lados da cidade de Berlim e, por isso, converteu-se em um grande símbolo da
Guerra Fria.
O Fim
da Guerra Fria
A Guerra Fria
teve fim com a dissolução da União Soviética que ocorreu em 26 de dezembro de
1991. O fim da URSS foi resultado da grande crise econômica e política que
atingiu aquele país a partir da década de 1970. A falta de ações para resolver
os problemas do bloco comunista foram responsáveis por levar o país ao fim.
A economia
soviética demonstrava, já na década de 1970, claros sinais de esgotamento e o
país era mais atrasado em relação às grandes potências. A indústria soviética
estava em queda, a produção agrícola era insuficiente e os indicadores sociais
começaram a regredir demonstrando um claro empobrecimento do país.
A disparada no
valor do petróleo criou uma falsa sensação de prosperidade no começo da década
de 1980 e, por isso, o país não passou por reformas importantes em sua
economia. Além disso, a sociedade soviética não tinha acesso a tecnologias que
garantiam avanço na qualidade de vida no ocidente e a corrupção tornava tudo
pior.
Dois acontecimentos
na década de 1980 acabaram agravando a situação do país. A invasão do
Afeganistão forçou a União Soviética a gastar milhões na luta contra os
rebeldes islâmicos e, em 1986, o acidente nuclear em Chernobyl causou morte e
destruição, além de forçar os soviéticos a gastarem altas somas para conterem
os efeitos do acidente nuclear.
A situação
econômica ruim contribuiu para aumentar a insatisfação da sociedade com os
governos comunistas. Em todo o bloco, a pouca liberdade de expressão e o
autoritarismo manifestado pelos governos comunistas era uma realidade, e a
insatisfação com a crise econômica e a questão política fizeram surgir
movimentos de oposição por todo o bloco comunista.
Os primeiros
sinais manifestaram-se na Alemanha Oriental, Hungria e Polônia. Os alemães
derrubaram o Muro de Berlim, no final de 1989, e promoveram a reunificação da
Alemanha, os húngaros abriram as fronteiras do país com o Ocidente e os
poloneses elegeram o primeiro governo não comunista desde a Segunda Guerra.
A União Soviética
começou a promover a abertura da sua economia no governo de Mikhail Gorbachev
por meio da Glasnost e Perestroika.
Logo, as nações que formavam a URSS começaram a se mobilizar pela sua
independência. Em 25 de dezembro de 1991, Gorbachev renunciou e, no dia
seguinte, a União Soviética foi dissolvida.
Em sequência,
uma série de países conquistaram a sua independência, tais como Ucrânia,
Bielorrússia, Armênia etc. Esses países reuniram-se na Comunidade dos Estados Independentes (CEI) e realizaram a transição
para o capitalismo.
Socialismo
real e Socialismo ideal
“Socialismo
real” ou “socialismo que realmente existiu” é a expressão utilizada para se
referir ao sistema econômico e político implantado na URSS a partir do governo
de Josef Stalin (1924-1953). Apesar de Stalin defender a teoria do “socialismo
em um só país”, o sistema se espalhou por vários países, como Cuba (1959),
China (1949) e Coreia do Norte (1950). Na Europa, a partir de 1949, no contexto
da Guerra Fria, o socialismo se disseminou nos países do leste aliados à URSS:
Hungria, Tchecoslováquia, Albânia, Romênia, Polônia, Iugoslávia, Bulgária e
Alemanha Oriental, tendo seu fim com a queda do Muro de Berlim (1989) e o
desmembramento da URSS (1991).
O
socialismo real caracteriza-se pela planificação da economia, estatização dos
meios de produção (as fábricas, as unidades agrícolas e os bancos pertencem ao
Estado), centralização do poder nas mãos do partido comunista, controle da
economia e dos salários e distribuição de renda organizada pelo Estado. Ele se
diferencia do socialismo ideal por vários motivos.
Para o
socialismo ideal, criado por Karl Marx e Friedrich Engels, o fim da propriedade
privada dos meios de produção e das desigualdades de classe seria inevitável,
uma consequência lógica do desenvolvimento do progresso humano, das próprias
forças produtivas do capitalismo, e deveria extrapolar os limites nacionais,
tornando-se um processo revolucionário internacional. Ora, não só este
“progresso” não se verificou como a consequência inevitável do desenvolvimento
das sociedades humanas, como também a revolução não se internacionalizou,
ficando restrita ao âmbito nacional, em alguns países. Ainda que a Revolução
Bolchevique de 1917, liderada por Vladimir Lenin, tenha sido realizada sob a
pretensão de alcançar uma escala global, essa pretensão nunca se realizou.
Além disso, as
condições históricas em que se deu o desenvolvimento do socialismo na URSS, a
partir da Revolução Russa de 1917, não se verificaram totalmente favoráveis à
implementação dos ideais de Karl Marx. Ainda no período inicial, sob o comando de
Lenin, a guerra contra os inimigos da revolução, um operariado desqualificado e
um campesinato faminto, além da crescente burocratização, levaram Lenin a
adotar medidas capitalistas para recuperar a economia russa, como a manutenção
da transmissão hereditária da propriedade e os investimentos estrangeiros na
economia. No período de Stalin, seus Planos Quinquenais, que transformaram um
país arcaico em uma potência industrial, impuseram vários sacrifícios aos
trabalhadores, que produziam aceleradamente sob forte controle e vigilância.
Por outro lado, ficaram garantidas moradia, alimentação, saúde e educação para
a grande maioria da população.
Socialismo,
capitalismo e ditaduras
É
importante compreender que socialismo e capitalismo são conceitos relativos a
sistemas econômicos que visam objetivos diferentes. Enquanto o socialismo visa
o bem comum, a distribuição de renda e/ou a reapropriação da riqueza por parte
dos trabalhadores, o capitalismo visa o lucro dos donos dos meios de produção
acima das necessidades dos trabalhadores. É assim que, no sistema capitalista,
é muito complicado adotar politicamente medidas de distribuição de renda e
igualdade de oportunidades, pois essas medidas se chocam fundamentalmente com o
próprio objetivo final do sistema que é o lucro. Para garantir seus lucros, as
classes dominantes são capazes de qualquer coisa, inclusive de adotar em seu
próprio país governos autoritários e ditatoriais, como ocorreu durante os
governos nazi-fascistas de Hitler e Mussolini. O discurso pela democracia só
domina quando a classe dominante não se vê em perigo de ter que dividir seus
lucros com os trabalhadores. É por isso que as ideias socialistas incomodam
tanto os empresários, os banqueiros e a mídia dominante (que opera a serviço do
grande capital), pois nenhum deles está disposto a abrir mão de seus altos
lucros.
Da
parte dos governos socialistas, o recurso a regimes ditatoriais não ocorreu
para garantir os lucros das grandes empresas, mas sim para evitar que a
revolução socialista fosse destruída pelas forças capitalistas. Durante a
Guerra Fria, isso foi notório. Explicar a adoção de regimes ditatoriais em qualquer
país – seja socialista, seja capitalista - não justifica, no entanto, as
perseguições, torturas e assassinatos que regimes autoritários praticam.
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